sábado, 18 de maio de 2013

Substituindo espírito competitivo por espírito solidário


A educação, segundo Freire, deve ter como objetivo maior desvelar as relações opressivas vividas pelos homens, transformando-os para que eles transformem o mundo.
Inspirada pelo anseio da substituição da escola como campo de batalha pela escola como ambiente de construção de cidadãos solidários quero propor uma ampla discussão sobre expressarmos no Manifesto da Educação Pública no Século XXI o término do hábito motivador de promover competições intelectuais dentro do ambiente escolar.
Sei que isto virá a desorganizar o sistema pois será necessário acabar com as olimpíadas de matemática...de filosofia...de soletração...primeiros colocados em uma Feira de Ciências... acabar com os concursos de redação...as provas classificatórias e seletivas.
Competição não rima com inclusão e é o oposto da solidariedade.



A respeito de competições tenho refletido que:
a)      A competição é a pequena guerra que legitima a grande.
b)       Competição individualiza o indivíduo e divide o público assistente em grupos inimigos de torcidas. 
c)       Competição estimula sentimentos de egoísmo, vaidade, ciúmes, inveja e desprezo.
d)      Competição é altamente excludente colocando em diferentes margens os perdedores:  Numa margem mais marginalizada temos os que nem sequer foram inscritos por falta de capacidade (estes são condenados à morte daquele saber). Depois em margens cada vez mais internas: os que foram eliminados porque foram piores do que os outros; os que foram excluídos por terem ficado nervosos na eliminatória; os que ficaram eliminados por décimos ou milésimos de pontos apesar de terem se esforçado e se superado... até aqueles que ficam nos míseros 6º,5º,4º lugares; os que se classificam em 3º e 2º lugares e no meio de todas estas margens está preso o que ficou em primeiro lugar pois se descuidar um pouco seu reinado acaba e ninguém nem sequer se lembrará dele. (Já acompanhei casos de depressão com ex-reis de olimpíadas da matemática e da soletração).
e)      Muitos, em nome de melhor motivar os alunos estimulam competições entre meninos e meninas. Sobre isto escrevi em http://elypaschoalickeosprofessores.blogspot.com.br/2012/09/nota-zero-para-professores-que.html

Urge construir novas relações de solidariedade para a boa convivência dos seres humanos em um mundo cada vez mais globalizado.

Tags:
Manifesto, solidariedade, competição, orgulho, ganhar, ser vencedor, educação, exclusão, inclusão, briga, discussão, inveja, inimizade. 

5 comentários:

  1. Infelizmente o espírito de competitividade é "o mote" da vez. As empresas estimulam; o sistema educacional. O ser humano desde a infância é preparado para a disputa, para procurar estar à frente de seu próximo.

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  2. Os Malefícios da Rivalidade na EscolaPoucas serão as escolas em que o mestre não anime entre os alunos o espírito de emulação; aos mais atrasados apontam-se os que avançaram como marcos a atingir e ultrapassar; e aos que ocuparam os primeiros lugares servem os do fim da classe de constantes esporas que os não deixam demorar-se no caminho, cada um se vigia a si e aos outros e a si próprio apenas na medida em que se estabelece um desnível com o companheiro que tem de superar ou de evitar.
    A mesquinhez de uma vida em que os outros não aparecem como colaboradores, mas como inimigos, não pode deixar de produzir toda a surda inveja, toda a vaidade, todo o despeito que se marcam em linhas principais na psicologia dos estudantes submetidos a tal regime; nenhum amor ao que se estuda, nenhum sentimento de constante enriquecer, nenhuma visão mais ampla do mundo; esforço de vencer, temor de ser vencido; é já todo o temperamento de «struggle» que se afina na escola e lançará amanhã sobre a terra mais uma turma dos que tudo se desculpam.
    Quem não sabe combater ou não tem interesse pela luta ficará para trás, entre os piores; e é certamente esta predominância dada ao espírito de batalha um dos grandes malefícios dos sistemas escolares assentes sobre a rivalidade entre os alunos; não se trata de ajudar, nem de ser ajudado, de aproveitar em comum, para benefício de todos, o que o mundo ambiente nos oferece; urge chegar primeiro e defender as suas posições; cada um trabalhará isolado, não amigo dos homens, mas receoso dos lobos; o saber e o ser não se fabricam, para eles, no acordo e na harmonia; disputam-se na luta.
    Urge quanto antes alargar a reforma radical que as escolas novas fizeram triunfar na experiência; que só haja dois estímulos para o trabalho nas sulas: a comparação de cada dia com o dia anterior e com o dia futuro e o desejo de aumentar o valor, as possibilidades do grupo; por eles se terá a confiança indispensável na capacidade de realizar e a marcha irresistível da seta para o alvo; por eles também o sentido social, o hábito da cooperação, a tolerância e o amor que gera a convivência em vez de um isolamento de caverna e de uma agressividade permanente; a vitória de uma ideia de paz sobre uma ideia de guerra.

    Agostinho da Silva, in 'Considerações'

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  3. a idéia de que a teoria de seleção natural Darwiniana propõe que a competição é força motriz da evolução é uma apropriação comum da teoria porém falaciosa.

    A teoria não postula que sobreviverão os indivíduos mais agressivos, competitivos, ou voltados para serem melhores do que os outros. Aliás , isto não faz sentido evolucionário algum.
    Entende como isso não tem relação com animais se esfaqueando pela vida?
    Hoje se compreende inclusive que a capacidade de cooperação , que é base fundamental dos animais sociais, foi vantajoso em determinados processos de seleção natural, o que faz todo o sentido se pensamos nos animais sociais. Aliás, é importante não dissociarmos competição como sendo um traço animal ( como se não fôssemos animais) e cooperação como um traço humano ( pois a cooperação ocorre e é absolutamente essencial no desenvolvimento de animais não humanos, notadamente mamíferos e aves)
    Sim, em nosso momento historico e cultural , a competicao é lida como se fosse a única mobilizadora de energias. Assim, um pressuposto repetido e "trepetido" é que as pessoas só colocariam energias em algo se forem motivadas pelo desejo de serem "melhores" do que os outros.

    Está claro que a compteção é um mecanismo de motivação; o problema é que a nossa sociedade o vê como o único, o mais saudável, o melhor para o desenvolvimento da pessoa.

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  4. Continuando a publicar os comentários de Simone psicóloga dao grupo RC Romanticos Conspiradores:
    É triste quando se reduz a motivação ao ímpeto de ser "melhor que" e desconsidera-se que alguem pode ser motivado pelo belo, pelo justo, pela bondade, pelo verdadeiro. Meu filho é músico. Porquanto a banda dele possa eventualmente se mexer para ganhar o prêmio "banda da semana " da MTV, concorrendo com bandas de todo o mundo, o que o faz acordar cedo ou dormir tarde para fazer múdica, praticar mesmo quando está com dor nos tendões, praticar mesmo quando está sobrecarregado no trabalho não é "ser melhor". É fazer algo belo.

    Minha filha é ativista e organiza , dentre outras coisas, manifestações. Ela não se mobiliza por fazer a maior, mais longa, manifestação que entre no guiness. O que a mobiliza é a justiça.

    Trago exemplos de meus filhotes inspiradores porque com eles pude vivenciar, na pré-escola associativista na qual estudaram, 10 anos de jogos com regras "subvertidas" para a colaboração ao invés de um ganhador e vários perdedores; de festas juninas onde mesmo nas corridas de saco todos eram aplaudidos e ficavam felizes por pular, cada um do seu jeito, na sua velocidade. Isso não quer dizer que não jogassem em momento algum um jogo competitivo. Mas na grande maior parte das atividades nem fazia sentido isso de um ranqueamento. E o respeito ao "jeito" de cada um era tão intrinseco que quando eles chegaram a outras escolas, acharam esquisito aquilo de uns ganharem pontos a mais do que os outros, sendo que cada um estava fazendo o que sabia/ gostava de saber.

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  5. Continuando os relatos de Simone:
    Nos mudamos e minha filha foi estudar numa escola que seguia a bíblia comportamentalista da economia dos tokens: bons comportamentos, ganhava um token. Maus comportamentos, perdia-se tokens de acordo com a "gravidade da infração".

    Logo nas primeiras semanas, ela ajudou uma menina a levantar no pátio e a levou à enfermeira para o curativo. A enfermeira prontamente deu um token para a minha filha pelo comportamento "solidariedade". Minha filha- que tinha paenas 5 anos- horroirizou-se com aquilo, não quis receber. Me dizia: mas mãe, eu não fiz aquilo para receber prêmio. Fui chamada à escola: minha filha não estava seguindo as regras da escola: comportou-se bem, ganha prêmio.Não adiantava eu falar sobre a diferença entre sentimentos e comportamentos condicionados. A comunicação não rolava.

    Quinzenalmente as crianças iam com seus tokens acumulados - fichinhas coloridas de plástico- a uma lojinha montada na escola com denzenas de brinquedos, cada um custando um número x de tokens.

    Os "bons" meninos saíam cheios de brinquedos. Os que haviam se comportado mal, chegavam sem tokens e saíam sem brinquedos.

    Os professores se gabavam de sua forma "moderna" de controle disciplinar e motivação: todo mundo competindo para ganhar mais tokens.

    Minha filha se angustiava: os mesmos coleguinhas chegavam todas as quinzenas de mãos abanando na "lojinha" e ainda saiam humilhados, envergonhados, enquanto tantos se gabavam de suas "compras". Não aguentou: começou a distribuir seus tokens para seus amigos menos afortunados. Novamente eu fui chamada na escola: minha filha estava subvertendo o mecanismo disciplinar da escola.

    É triste que uma criança de 5 anos pudesse ver a flagrante injustiça e insensatez do sistema e não aqueles adultos. Mas é lindo que ela pudesse entender isso.

    Hoje minha filha é professora de crianças, e na escola onde começou a dar aulas, logo sugeriram que ela poderia dar adesivos às boas crianças (para motivar todas a serem "boas"). O sangue dela logo ferveu. Contra-argumentou, mas disseram: é assim que fazemos, funciona, eles competem apra ver quem ganha mais adesivos.

    Na sala dela, todos ganham adesivos proque gostam dos adesivos, porque os adesivos são legais, porque os adesivos têm figuras e formas e cores que dão margem para conversar, rimas, brincadeiras, artes. Ninguem sai com mais adesivo do que o outro , e ninguem precisa "comprar" um adesivo com seu "bom comportamento". O envolvimento dos alunos com a aula dela - isso ela tem que se rebolar para conquistar. Não serão os malditos adesivinhos que vão garantir.

    Podemos contruir um mundo no qual nossa motivação não passe por sermos melhores do que os outros? Eu penso que sim. Bora?

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